Crítica | O Corcunda de Notre Dame (1996)

A obra literária de Victor Hugo lançada originalmente no ano de 1831 é de conhecimento e aclamação de vários. E nem é para menos. Victor Hugo criou uma fantástica obra que consegue emocionar todos que a leem com personagens bem desenvolvidos e uma história cativante. Dos anos de 1989 a 2000, os estúdios da Disney passaram por um momento de “renascimento” onde elas voltaram a lançar filmes que foram enormes sucessos de público e crítica. A Pequena Sereia, A Bela e A Fera, Rei Leão e Tarzan são alguns dos exemplos de filmes lançados durante esse tempo. E no ano de 1996, foi que a Disney lançou uma adaptação da tão famosa obra de Hugo, “O Corcunda de Notre Dame”.

No começo do filme, o espectador vê toda a cidade de Paris acordando para um novo dia de trabalho enquanto o cigano Clopin chama todas as crianças ali presentes para ouvir uma história que envolve um homem e monstro. Então somos transportados para Paris anos atrás onde acompanhamos três ciganos, dois homens e uma mulher, que desejam entrar anonimamente na cidade, com a cigana levando uma criança recém-nascida enrolada, quando são impedidos pelo Ministro da Justiça Claude Frollo que abomina ciganos e pensa que a mulher está levando coisas roubadas.

A cigana consegue fugir dos guardas de Frollo, mas o ministro a persegue até ela chegar à Catedral de Notre Dame e pedir Santuário. Antes da ajuda chegar, Frollo tenta puxar o bebê de suas mãos e chuta cigana fazendo com que ela quebre seu pescoço nos degraus da Catedral. Quando Frollo descobre que na verdade o bebê é cheio de deformações faciais pensa que ele é um monstro e pretende o jogar no poço até que é impedido pelo Arquidiácono que fica horrorizado pela matança que aconteceu na sagrada catedral e diz que Frollo terá que mudar suas ações agora, começando por salvar a vida do bebê, se não quiser ser condenado eternamente. O ministro se sente julgado pelas imagens de Santos de Notre Dame, numa cena fantástica que mostra toda a presença da Igreja na história, e salva o bebê e pretende cuidar dele, apenas se ele viver escondido de todos dentro da Catedral.

Quasímodo cresce isolado de todos e faz os seus amigos imaginários que são as três gárgulas falantes: Victor, Hugo e Laverne; com os dois primeiros sendo uma óbvia referência ao autor da obra literária e a última se destacando quando os pássaros pousam em cima dela e a personagem tem um ataque de raiva gerando ótimos momentos cômicos. Um dos sonhos de Quasímodo é ir para o famoso Festivais dos Tolos que é uma das maiores festas populares de Paris no filme. As gárgulas clamam para ele ir para a fora e conhecer outras pessoas, porém Frollo sempre o manda ficar na Catedral dizendo que o mundo é hostil e que ele só ia encontrar pessoas sem coração como a sua mãe, já que Frollo mente para Quasímodo dizendo que a sua mãe o abandonou de forma impiedosa. O corcunda finalmente decide ir e chegando lá conhece a belíssima cigana Esmeralda que dança com o seu bode Djali na frente de uma multidão no Festival, dentre eles o Capitão Phoebus que acabou de voltar para Paris após servir em uma batalha.

Em todo o Festival acontece a famosa coroação do Rei dos Tolos, onde plebeus se fantasiam com a máscara mais feia que tiverem e o mais feio é coroado. Os cidadãos confundem a face deformada de Quasímodo com uma máscara e ele é coroado como o vencedor de concurso e quando descobrem que não era uma máscara o ridicularizam em praça pública jogando alimentos nele. O sineiro pede ajuda ao seu mestre, mas ele, como uma forma de disciplinar o criado, ignora o pedido de apelo. Finalmente, a cigana para o ato de crueldade salvando o corcunda e provocando Frollo dizendo que ele não oferece justiça. Por causa desse ato, Esmeralda é obrigada a se refugiar na Catedral pedindo Santuário ou será executada.

O roteiro da animação não falha em transpassar toda a sensibilidade e comoção da história. Desde o começo já nos afeiçoamos ao corcunda e a sua vontade de conhecer o mundo afora, de conhecer outras pessoas e de esperar que todos vejam o que ele é por dentro e não se aterrorizem por sua face monstruosa. E depois do Festival, ele perde todas as esperanças até que conhece de forma mais íntima Esmeralda que é uma luz que veio do Paraíso a qual ele pensava que nunca iria presenciar. E como a dublagem de Tom Hulce consegue passar todos esses elementos citados sendo um trabalho de dublagem excepcional.

Se tratando de um filme dos estúdios da Disney é claro que ele teria que “suavizar” muitas partes do livro já que nele há cenas de assédio sexual e violência, mas mesmo com essa “limpeza” esse é provavelmente o filme da Disney mais “sombrio”, por falta de melhor palavra. “O Corcunda de Notre Dame” fala sobre eterna condenação e desejo com algumas mensagens subliminares que as crianças não irão perceber. Alguns fãs do livro reclamaram muito da forma como a Disney adaptou a obra, mas alguém realmente achava que um desenho animado voltado para crianças iria ser 100% fiel ao livro?

Outro detalhe que irritou alguns fãs foi a presença das gárgulas falantes que no contexto pode ser justificada por dois motivos: a Disney precisava deixar a história mais adepta ao público infantil e mostrar a consequência gerada pelo isolamento de Quasímodo. As gárgulas não interferem em momento algum da história nos ajudando a conhecer mais sobre o corcunda. A animação é outro destaque a se louvar principalmente toda a criação da Catedral. Da sua porta até a torre dos sinos. No livro, Victor Hugo descreve Notre Dame com a maior quantidade de detalhes já imaginado e o tratamento dado pelo filme não podia ser diferente. Sentimos como se a Igreja fosse uma das personagens do filme mesmo sem ela dizer uma única fala.

O tratamento dado ao antagonista do filme foi perfeito, sem sombra alguma de dúvida. Frollo é definido no começo como alguém inflexível que custe o que custar acabará com os ciganos em Paris. E quando ele vê Esmeralda dançando, ele começa a entrar em perdição com a sua mente caindo no pecado do desejo. Ele fornece o ultimato a ela: ou ela o ama ou enfrentará o fogo de sua justiça queimando no fogo, como é bem explícito na música “Hellfire” que retrata de forma perfeita toda a confusão que Frollo sente dentro de si. E a dublagem de Tony Jay caiu como uma luva perfeita para o papel com o seu tom de voz grosso, penetrante e marcante. Tanto o seu personagem como a sua dublagem são os destaques absolutos da animação.

Esmeralda aqui é retratada de uma forma bem diferente do que no livro sem todo o drama familiar que ocorre no final da obra literária. Aqui ela luta pelo bem do seu povo acima de tudo e pelo reconhecimento dele. Demi Moore dublando a personagem também se destaca assim como Kevin Kline que dubla o Capitão Phobeus que começa aliado de Frollo e depois percebe que ele está chacinando vários inocentes e o desobedece.

A trilha sonora de Alan Menken é um dos maiores acertos da produção. Não há músicas contagiantes aqui que ficam presas na cabeça do espectador, mas sim músicas emocionantes com algumas delas envolvendo coros religiosos. A já citada Hellfire, Out There, The Bells of Notre Dame e God Help The Outcats são os maiores destaques de uma trilha acima da média. O clímax do filme também é elogiável mostrando a população de Paris se revoltando contra Frollo e seus guardas, pois ele havia ofendido a santidade Notre Dame para concluir seus objetivos malignos resultando numa ótima batalha com momentos cômicos. A cena em que “lava” sai da boca das gárgulas de Notre Dame é simplesmente incrível.

O Corcunda de Notre Dame” é uma animação louvável e com toda a certeza uma das melhores já feitas pela Disney, porém muitas vezes é rebaixada de forma injusta. Trata-se de um filme com uma mensagem comovente se destacando em todos os seus aspectos. Após já terem visto a obra, desejaria que respondessem o seguinte enigma feito por Clopin no inicio o filme: “Quem é o homem e quem é o monstro?”.

Título Original: “The Hunchback of Notre Dame” (1996)

Direção: Gary Trousdale e Kirk Wise

Roteiro: Tab Murphy, Irene Mecchi, Bob Tzudiker, Noni White, Jonathan Roberts

Elenco: Tom Hulce, Tony Jay, Demi Moore, Kevin Kline, Jason Alexander, Paul Kandel, Charles Kimbrough, David Ogden Stiers

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