Crítica | Ele está de volta! (2015)

Comédia de humor negro, uma boa sátira ou um exercício de pensamento crítico em relação à sociedade Alemã atual?

Esse filme pode parecer mais uma comédia banal e oportunista se valendo de um dos nomes mais conhecidos e temidos da história mundial, mas não se engane, estamos diante de uma obra que meche em uma ferida ainda aberta e discutida com parcimônia pelos próprios alemães. É justificável que um assunto tão delicado seja motivo de desconforto para parte do povo Alemão, daí a importância do filme “Ele está de volta”, baseado no livro homônimo lançado em 2012, escrito por “Timor Vermes”. Infelizmente, não posso dizer nada a respeito do livro, uma vez que não o li, (pretendo começar para ontem), mas por enquanto, mantenho a análise em torno do filme.

Sinopse

Colocar um Adolf Hitler em contato com a sociedade moderna, dispondo de todas a ferramentas necessárias para enviar sua mensagem é um exercício curioso e inusitado. O filme começa com Adolf Hitler (Oliver Masucci) despertando em 2014, totalmente desorientado. Encontra três garotos e já tece elogios à juventude alemã. Ao caminhar por uma praça, Hitler ainda uniformizado, é confundido com um artista de rua ao tentar obter informações e se situar, logo vai parar em uma banca de jornais, onde é encontrado por Sawatzki (Fabian Busch), freelancer de uma importante emissora de TV alemã, que vê a oportunidade de salvar sua decadente carreira na emissora. Então Sawatzki tem a brilhante ideia de fazer Hitler percorrer a Alemanha conversando com o povo enquanto grava os diálogos. Levado até a sede da emissora de TV por Sawatzki, Hitler é obviamente confundido com um humorista e rapidamente ganha espaço na mídia com um programa de humor, maravilhado com a oportunidade de continuar com seus planos de dominação mundial, Hitler vai ganhado espaço na emissora…

Imagine-se sendo pego em uma situação tão desconfortável e vexatória a ponto de não querer falar a respeito, agora estenda essa sensação à uma nação inteira, fadada a pisar em ovos eternamente diante do resto do mundo. Pois esta é a sensação de parte do povo alemão, que invariavelmente será taxada de racista, fascista ou algo que o valha, simplesmente por emitir uma opinião atravessada ou mal interpretada. Obviamente, intolerância está presente em todos os cantos do mundo, mas sem dúvida, será tratada de forma diferenciada quando vier do país de origem do Nacional Socialismo de Adolf Hitler. O diretor David Wnendt então, coloca o próprio Hitler para percorrer as ruas da Alemanha, e as reações das pessoas diante do suposto Führer  são as mais variadas possíveis, desde o asco e revolta ao ver um homem fantasiado de Adolf Hitler em plena Alemanha moderna, à reações extremamente positivas seguidas de palavras de apoio ao ditador.  Vou frisar bastante essa parte do texto: ” O ator vai às ruas vestido de Adolf Hitler e conversa com as pessoas, cidadãos Alemães de verdade, e o resultado disso é surpreendente, parte das pessoas reagem negativamente e parte das pessoas vão até ele e emitem palavras de apoio!” Perturbador, não acha?

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Piadas racistas e anti-semitas são usadas de forma destemida pelo diretor David Wnendt, é difícil usar algo assim como ferramenta sem temer um massacre por parte de críticos oportunistas, felizmente o diretor teve culhões e conseguiu demonstrar perfeitamente o efeito que algumas palavras trazem em uma sociedade estigmatizada.  Outro ponto positivo na abordagem, é a reação de Hitler ao perceber no que a Alemanha se tornara, as análises à respeito da Chanceler Angela Merkel, e dos partidos políticos atuais são engraçadíssimas, para se ter uma ideia, Hitler chega a conclusão de que atualmente, o único partido a que se filiaria na Alemanha, seria uma espécie de Partido Verde Alemão.

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Algumas interações entre o ator e cidadãos alemães, demonstram claro ressentimento nutrido contra os imigrantes, e o ator faz um trabalho espetacular ao interpretar Hitler, conseguindo fazer com que as pessoas dialoguem como se estivessem falando com o ditador em pessoa, um senhor chega inclusive, a reclamar que a entrada de negros na Alemanha fez com que a média de Qi decaísse de 80 para menos 60, outro sugere que o país deva ser dirigido novamente com pulso forte como no passado, relatos de pessoas comuns que sem o menor pudor, mostram que ideias fascistas ainda não foram extirpadas da Alemanha. O interessante é ver que o ator conduz de forma natural as entrevistas improvisadas, demonstrando versatilidade.

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O filme é impactante e serve de alerta para autoridades Alemãs a respeito do populismo político, é uma brincadeira séria, que acaba revelando que em pleno 2014-2015 (data de lançamento do filme), existe solo fértil para o plantio de idéias nacionalistas de extrema-direita, uma mistura de insatisfação popular com o surgimento de um líder carismático poderia resultar em uma repetição de fatos lamentáveis.  O diretor se mostra hábil ao mesclar encenações com conversas reais durante parte do filme. As atuações são boas, com destaque para o protagonista e mais ainda para o diretor. Eu não poderia traçar um paralelo com o livro, uma vez que ainda não tive a oportunidade de lê-lo, independente do material de origem, o filme é excelente e vale a pena ser conferido, veja o trailer:

Para quem se interessar, e eu pessoalmente recomendo, o filme está no catálogo da Netflix, e além de divertido, proporciona uma reflexão interessante a respeito de como à sociedade se portaria diante de uma figura tão terrível quanto Adolf Hitler, e pasme você, não me surpreenderia se a mídia conseguisse transformar um monstro em um líder a ser seguido novamente…

Ele Está de Volta (Er ist wieder da), Alemanha, 2015
Direção: David Wnendt
Roteiro: David Wnendt, Mizzi Meyer, Marco Kreuzpaintner, Johannes Boss
Elenco: Oliver Masucci, Fabian Busch, Katja Riemann, Thomas M. Köppl, Marc-Marvin Israel
Duração: 118 min.

até a próxima pessoal! 

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