Crítica | Lawrence da Arábia: O Filme (1962)

Você meu amigo cinéfilo, já assistiu ao clássico Lawrence da Arábia?

Pois deveria, esse maravilhoso épico biográfico é uma adaptação do livro “Os sete pilares da sabedoria”, uma autobiografia do militar, arqueólogo, agente secreto, diplomata e escritor britânico Thomas Edward Lawrence conhecido entre os árabes como Aurens ou El Aurens. Durante a primeira guerra mundial, ocorria a Revolta Árabe de 1916 a 1918, orquestrando e participando ativamente, Lawrence ou Aurens, tornou-se um notório herói militar combatendo o Império Turco Otomano aliado da Alemanha, ajudou os Árabes a recuperarem os territórios ocupados reavendo assim sua soberania.

“Todos os homens sonham, mas não da mesma forma. Os que sonham de noite, nos recessos poeirentos das suas mentes, acordam de manhã para verem que tudo, afinal, não passava de vaidade. Mas os que sonham acordados, esses são homens perigosos, pois realizam os seus sonhos de olhos abertos, tornando-os possíveis. — T.E. Lawrence, Os Sete Pilares da Sabedoria.”

Sinopse

Durante a primeira grande guerra, Lawrence (Peter O’Toole), ainda um jovem oficial do exército britânico, pede para ser destacado da base do exército britânico no Cairo, para a Península Arábica por razões pessoais. O tenente Lawrence, um profundo admirador do deserto, dos costumes árabes e do exótico estilo de vida dos beduínos, interessa-se pela oportunidade de libertar o povo árabe do julgo do império Turco Otomano. Lawrence rapidamente ganha o respeito e a admiração tanto dos rebeldes árabes quanto do príncipe Faiçal (Alec Guinness), conquistando com astúcia a província de Aqaba, local estratégico para os turcos. Se valendo de táticas de guerrilha, promove sucessivos assaltos a trens turcos, praticamente minando as forças turcas e enchendo os rebeldes com os espólios do inimigo. 

Esta modesta análise, tentará mostrar como a combinação entre um elenco absurdamente talentoso e um material base riquíssimo, pôde dar origem ao “épico de todos os épicos”, um dos melhores filmes de todos os tempos incontestavelmente. São quase quatro horas de uma verdadeira ode ao cinema, onde cada cena é capaz de encher os nossos olhos, sempre que congelamos a imagem, vemos uma verdadeira pintura, uma obra de arte.

O filme começa com Lawrence acelerando uma moto de  forma displicente, posteriormente desviando de alguns pedestres e sofrendo o acidente que o levaria ao coma e consequentemente à morte. Após o velório, conversas corriqueiras a respeito do caráter de Lawrence vão descrevendo de forma indireta, detalhes da sua personalidade e em seguida somos levados aos acontecimentos de Lawrence na Arábia. Teria sido ele um herói de guerra ou apenas um excêntrico em busca de fama? É fácil perceber o cuidado com que o roteiro foi construído, não deixando nenhum diálogo solto sequer, tudo encaixado de forma perfeita pelo diretor David Lean (A ponte do rio Kwai, 1957) e executado com maestria pelo elenco.  É fato que o filme apresenta fotografia lindíssima e inigualável, dispondo de locações reais escolhidas minuciosamente, e uma das coisas que contribui para essa excelência, é a caracterização dos personagens, basta olhar para Peter O’Toole como Lawrence e comparar com uma foto original de Thomas Edward Lawrence para perceber o esmero da produção:

                          

O detalhismo no figurino vai além do protagonista e dos coadjuvantes, o grande número de camelos utilizados, os efeitos visuais, explosões, descarrilhamento dos trens  combinados com os cenários, tornam o filme realmente muito bonito, tudo é executado com perfeição em uma era livre do CGi, nota-se que tudo é fruto de muito trabalho e empenho.

A primeira missão de Lawrence após receber autorização para partir à Arábia por parte do General Allenby (Jack Hawkins), é encontrar com o Príncipe Faiçal no deserto, Lawrence parte com um guia beduíno, ambos se tornam amigos no caminho. Ao parar em um poço, enchem seus cantis, descansam e após um tempo vislumbram uma silhueta ao longe, trata-se de um homem de uma tribo rival à do guia beduído, sem descer da montaria, desfere um tiro no beduíno e diz a Lawrence que o seu guia sabe desde a infância, a quem pertence os poços d’água da região. A escassez torna o povo do deserto rude propenso a barbárie, o choque cultural entre o europeu e o árabe é enorme e Lawrence inicialmente não consegue compreender a violência entre as pessoas de tribos diferentes que compõem o mesmo país. O acontecimento serve para dar uma ideia da dificuldade que Lawrence encontrará, para reunir homens de tribos diferentes em um mesmo exercito.

O diretor David Lean, munido de um roteiro perfeito, consegue demonstrar o lado persuasivo  e eloquência do jovem Lawrence ao negociar com o Príncipe  Faiçal qual seria a melhor estratégia para arregimentar seu exército rebelde. Decidem então, sem anuência do comando do exército britânico, e a contragosto de Sherif Ali ibn el Kharish (Omar Sharif), servo do príncipe, somar suas forças com outras tribos, para tanto, Lawrence deve cruzar o deserto com apenas 50 homens e conquistar Aqaba, que se encontra em poder dos Turcos. Foi durante a travessia do inóspito deserto que a produção deu um show à parte, enquanto a caravana seguia rumo ao seu destino, passando por dunas, pedregulhos e sofrendo com o sol escaldante, as paisagens iam ficando cada vez mais deslumbrantes, por incrível que pareça, a produção nos faz entender os motivos que Lawrence diz ter para amar o deserto e seu estilo de vida.  O encontro com Auda abu Tayi (Anthony Quinn) vem com uma das cenas mais tensas do filme, Anthony Quinn está inspirado e contracenando com outro gênio Omar Sharif, (já amigo e partidário de Lawrence) a cena ganha enorme proporção.

Lawrence tinha suas motivações e aspirações pessoais como todos nós, o filme o mostra como um bom aventureiro insubordinado, apaixonado pelo deserto e em alguns momentos, desejando torna-se um típico árabe. Em contra partida, fica no ar a impressão que algumas pessoas tinham dele, como um homem que cobiçava a fama e o desejo de usar a revolta árabe para se promover, vociferando e comemorando em cima dos trens ou posando para fotos após o sucesso de suas investidas, o filme mostra seu lado folclórico que tanto servia para atrair seguidores. Lawrence por sua vez, frequentemente questionava os interesses políticos  do governo britânico, se queriam mesmo tirar a Arábia do domínio Turco e devolver para os árabes ou se havia algo por trás das cortinas. O fato é que Lawrence caminhou entre os rebeldes árabes e o exército britânico, e seu nome ficará marcado na eternidade como o líder da revolução que trouxe a soberania para o povo árabe.

O filme lançado em 1962, contou com um orçamento de 300 milhões de dólares, valor expressivo para os padrões da época. São 216 min, quase quatro horas de filme, realmente vale a pena cada minuto investido!

Direção: David Lean
Roteiro: Robert Bolt, Michael Wilson
Elenco: Peter O’Toole, Omar Sharif, Alec Guinness, Anthony Quinn, Jack Hawkins, José Ferrer, Anthony Quayle, Claude Rains, Arthur Kennedy, Donald Wolfit, I.S. Johar, Gamil Ratib
Duração: 216 min

Espero que tenham gostado da análise e recomendação! Até breve! 

 

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