Guerra Sem Fim começa sua narrativa nos apresentando uma espécie hostil que terá sido responsável pelo desaparecimento de algumas naves terrestres, logo apanhamos alguns detalhes que nos fazem questionar a verdadeira origem da guerra e a forma como esta está a ser conduzida. Se a guerra pode ser vista, do ponto de vista econômico, como uma força impulsionadora de algumas indústrias e avanços tecnológicos, verdade é que, pode também, ser usada como forma de exercer pressão nas sociedades, para implementar limitações na liberdade. Aliás, este é um conceito de inimigo comum, vigilante e poderoso que foram trabalhados em obras como 1984 .
Não só a guerra mas, também o crescimento absurdo da população humana, todos os bens são racionados, e a maioria das pessoas não possui um emprego. Esta percepção crítica da sociedade em que alguns se mantém à margem, onde podem viver em paz e produzem os mantimentos para os restantes, que permanecem em cidades decadentes carregadas de violência, é apenas uma pequena parte da história mas que terá um efeito determinante em fazer regressar à guerra, soldados que já estavam fartos de morte e destruição.
O inimigo é materializado sob a forma de alienígenas, os Tauran. As batalhas decorrem em condições extremas e várias expedições são enviadas para os destruir. Acompanhamos Mandella, um soldado que consegue sobreviver às duras condições de treino onde padece a maior parte dos colegas, e que faz parte da primeira missão em que se consegue capturar um Tauran. De missão em missão percebe que está cada vez mais isolado e que, apesar de pouco ter envelhecido, a vida passa na Terra. Depois de uma missão catastrófica em que resta ele e uma companheira, tentam regressar às suas respectivas famílias, descobrindo que a sociedade está caótica e que já não têm lugar entre os civis. Qualquer semelhança com a realidade dos soldados que retornam da guerra não é uma coincidência.
Depois de alguns episódios violentos ambos resolvem regressar às missões. Demasiado distantes do inimigo, as viagens provocam discrepâncias temporais na vida dos soldados. Mandella vê-se, assim, no ano de 2458, isolado da sua parceira de guerra e, entretanto, companheira, como um homem adulto incapaz de se adaptar às novidades sociais. É que a homossexualidade passou a ser imposta como forma de controlar a natalidade (que apenas existe por meios artificiais) e Mandella é, na prática, o ser humano com comportamento sexual desviante, visto como uma raridade estranha.
A par com a natalidade artificial existe a seleção e uniformização genética, eliminando diferenças raciais e doenças – ainda que esta seleção possa não ser assim tão vantajosa como poderá parecer à primeira vista. Se ambas podem ser defendidas positivamente como tendo em vista a eliminação do racismo e de efeitos genéticos nefastos (pontos expressos durante a narrativa), a verdade é que, do ponto de vista biológico, a eliminação da variedade, a par com a gestação exterior, pode vir a ter duras consequências futuras pela dependência da tecnologia.
Numa sociedade tecnologicamente avançada, como convencer soldados inteligentes a lutar? A ideia de um inimigo não é suficiente. Mesmo tratando-se de seres alienígenas, são humanoides e podem causar empatia. Nada melhor do que uma campanha para distinguir o outro, com recurso a mensagens subliminares onde se relata a violência que terá perpetuado, como forma de incitar respostas selvagens. Mesmo que o cérebro consciente do soldado perceba que estes relatos são impossíveis e irracionais, o que lhe provoca dissonância emocional.
O autor infelizmente retrata os homens desse futuro um tanto efeminados de maneira caricata,em 2002 o autor disse que não teria feito isso se o livro fosse escrito nessa época. De qualquer forma, trata-se de um livro muito importante para tentarmos entender melhor o que a guerra do Vietnam significou para a sociedade americana, e para o mundo.
Joe Haldeman usa a vida de Mandella, implementando vários elementos paralelos com os que lutaram no Vietnam, para fazer uma crítica intemporal às motivações políticas e econômicas por detrás das guerras, bem como ao condicionamento dos soldados, o valor das suas vidas e o retorno a uma vida civil. Tudo isto enquanto nos apresenta uma narrativa com elementos de tecnologia avançada e se questiona sobre a sua utilização. E é por todas estas razões que este é, sem dúvida, um grande clássico do gênero.
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